sábado, 27 de abril de 2013

FALAR PORTUGUÊS, UMA MALDADEZINHA JORNALÍSTICA

Aqui há dias a Televisão Nacional da Guiné-Bissau (TGB) recebeu uma torrente de visitas (três numa assentada). Visitas, diga-se de passagem, que já se  tinham tornado numa rarridade nos últimos tempos, para alegria dos jornalistas. Coube-me, logo eu,  em sorte (grande sorte! De resto, os colegas jornalistas passaram todo o dia a perguntar-me com quem  me tinha cruzado logo pela manhã a caminho da TGB). Só podia aceitar o desafio, até para não levar uma ocorrência em cima.

Alunos, professores e responsáveis directivos de uma escola  primária privada foram os primeiros a se apresentarem. A visita correu lindamente. A língua portuguesa serviu de instrumento. Chegado o momento das entrevistas, os petizes uma menina e um menino, falando em nome dos calegas, lá se desenvencilharam, ainda que pontapeando aqui e ali a língua de Camões.

A visita seguinte era composta por representantes associativos de todos os bairros da capital motivados pela comemoração de mais um aniversário da sua confederação. O crioulo fez as honras da casa.

Por fim, lá para o fim da manhã, a última visita anunciou-se. Eram estudantes do ensino médio profissionalizante, liderados por uma professora novinha em folha e vivíssima da silva. De resto, metralhou o nosso bom e simpático chefe de redação com perguntas sobre censura, ética profissional e coisas que tais.
A visita foi conduzida toda ela em criuolo. Quando chegou a hora H das entrevistas, quase toda a gente estava predisposta a dar o seu parecer. Estava, note-se, desde que fosse em crioulo! Ao serem informados que seria em português (maldade minha) foi a debandada que se viu. Logo para rogarem: crioul, tem pacença. É na bai ri de nós na cassa (que seja em crioulo! Caso contrário, vão-se rir de nós em casa). Até o cameraman se apiedou deles, juntando-se ao coro de rogos. Nada feito. Ou em português ou não haveria entrevista para ninguém. Deixei vincado. Já que era assim, que a professora falasse - encolheram os ombros. Claro que falaria com a professora a seu tempo, mas interessava-me também ouví-los, se não se importassem - voltei à carga.
Assim, convidei um, todo engravatado (aliás, o único engravatado) a falar da experiência. Hesitou. Recusou. Incentivado pelos colegas, aceitou o repto. Ajeitou a gravata e zás, maltratou  sem piedade a língua de todos nós.
Se pôr os rapazes a dizer algo foi difícil, com as raparigas então foi quase impossível. Até que a honra da tribo foi salva in extremis, como se diz na gíria futebolística, por uma delas que se lançou literalmente, vinda de nenhures, ao microfone.

Moral da história: exprimir-se em português nos media continua a ser uma grande dor de cabeça (incurável até, ao que parece) para a generalidade dos guineenses. Jornalistas, professores, ministros, directores gerais, directores liceais quase todo o mundo evita a língua portuguesa sob o pretexto de se alcançar a maior audiência possível com o recurso ao crioulo.
Assim, não! Só com o crioulo, seguramente, não iremos longe.  
Ainda há dias alguém recordou uma sábia frase de Cabral: " a língua portuguesa é a maior riqueza que os tugas nos deixaram".
Pior: se até à data ainda estamos para dominar a nossa língua oficial, quando faremos nossa a língua francesa, que cada vez se impõe, por força da integração reginal! Um exemplo: quem não saiba francês dificilmente arranja um bom emprego na "Nossa Pátria amada" de hoje.

FALE-SE PORTUGUÊS, AINDA QUE EM CRIOULOGUÊS


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